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terça-feira, 4 de maio de 2021

A Resposta de Ptolomeu aos Críticos da Astrologia: Exemplo Textual


Pedersen, O., 2011, A Survey of the Almagest401-3.

Ptolemy first refers to the obvious fact that the Sun regulates the seasons, thus influencing all forms of life on the Earth, and that the Moon governs the tides. This is obviously true; but now the principle of the uniformity of nature leads Ptolemy astray. He maintains that also the water in rivers increases and diminishes with the light of the Moon, and that plants and animals are sympathetic to it because of their
moist nature. Now the Sun and Moon are only two representatives of the heavenly bodies, and all the rest must be supposed to cause similar effects. Even the fixed stars are assumed to have a direct influence on meteo'rological conditions. These many influences can mutually interfere, so that their total effect on a particular phenomenon is determined by. the positions of the heavenly bodies relative to each' other, i.e. by their various aspects. The argument continues by stating that the influence of the Sun is felt even by animals, and that farmers and herdsmen are able to make predictions from the stars based ,upon repeated everyday observations. The same is the case with sailors. On the other hand, the more intricate predictions are possible only for people able to observe and describe the aspects of the heaven in greater detail, i.e for professional astronomers.

Having thus established a positive basis for astrology, Ptolemy t,ries to refute some of the criticisms, levelled 'against it. That charlatans and impostors have been unable to make true predictions proves nothing but that they are uninstructed and take too few of the relevant circumstances into account. No science is discredited because ignoramuses misuse it. Admittedly astrology is a difficult science, but if the astrologer does not promise too much, and if he has a solid astronomical background, one should not deny the possibility of making plausible predictions, just as we do not dismiss the whole science of navigation because pilots sometimes err. 

Besides being possible, astrology is also beneficial. Again Ptolemy begins with a number of positive reasons. First he points to the general pleasure and satisfaction connected with any true insight into things, both human and divine. (The inference is that, everything considered, Ptolemy attaches more importance to delight in knowledge as such than to, its practical utility.) But astrology is particularly useful as a means of knowing what is harmful or good for both body and soul, ,enabling us to predict not only occasional diseases or the length of life, but also external· circumstances which have a direct and natural connection with the original gifts of nature, such as property and marriage in the case of the body, and honour and dignity in the case of the soul.

Among the objections to the usefulness of astrology is that it does not help people to become rich or famous, but only reveals their unavoidable fate, which were better if it remair:ed hidcen. To the first part of this rather materialistic objection Ptolemy remarks that the sarr:e is true of all philosophy, since knowledge as such does not lead to material gains.. To the latter part he replies as a true Stoic philosopher that the foreknowledge of the unavoidable is useful to the soul, which can thus rejoice in future pleasures or compose itself to meet future pains with calm and steadiness. 

This defense of astrology is an intelligent piece of reasoning which shows that Ptolemy was no uncritical adherent of a doctrine which to later times appears as mere superstition. On the one hand he tried to find a rational basis making the possibility of predictions acceptable. On the other hand he was completely aware that the empirical foundation of astrology was much weaker than that of astronomy, resting as it did upon everyday experiences in contrast to the precise observations of the Almagest, and upon correlations of a not too satisfactory character. He thus had to place astrology at a lower scientific level than astronomy, and it is worth noticing that astrology found no place whatever in the Almagest (cf. Kattsoff, 1947, p. 18). To Ptolemy the precise mathematical theories of the Almagest not only represent the highest level astronomy was able to attain, but also the very summit of human knowledge. Not all his followers retained this order; many Arab and Mediaeval astronomers considered planetary theory as a simple introduction to the art of prediction, thus separating Ptolemy's results from the spirit in which they had been achieved.


Pedersen, O., 2011, A Survey of the Almagest, with Annotation and New Commentary by A. Jones. Nova Iorque: Springer Science+Business Media.

terça-feira, 2 de maio de 2017

Acerca dos Signos Masculinos e Femininos segundo Ptolomeu (Excerto)

Ptolomeu
(c.90 E.C. - c.168 E.C.)


Tetrabiblos, I, 12.

Acerca dos Signos Masculinos e Femininos


  Uma vez mais e de igual forma, elegeram seis dos doze signos como sendo de uma natureza masculina e diurna e, em igual número, como de uma feminina e nocturna. Uma outra regra foi-lhes atribuída, pois o dia desperta sempre da noite e próxima dela, tal como a fêmea do macho. Assim, por as razões já mencionadas, Carneiro é considerado o ponto de origem e, como o macho também governa e detém o primado, uma vez que, em força, o activo é sempre superior ao passivo, os signos de Carneiro e Balança são designados como masculinos e diurnos. Simultaneamente, uma outra razão detém-se no facto de que o círculo equinocial, delineado através deles, completa o primeiro e mais poderoso movimento de todo o universo. Os signos que a eles se sucedem, tal como já afirmámos, correspondem a uma outra disposição.

  No entanto, outros refutam esta regra dos signos masculinos e femininos, defendendo que o masculino começa no signo ascendente, designado por Horóscopo. Do mesmo modo que, para alguns, os signos solsticiais iniciam-se no signo lunar, uma vez que a Lua muda de direcção de uma forma mais rápida que os restantes. Desta forma, inauguram os signos masculinos com o Ascendente (Horóscopo), pois é aquele que está  mais a Leste, ora alguns, como já referido, recorrem a uma regra alternada de signos e outros dividiram-nos pelos quadrantes, designando como matutinos e masculinos os signos do quadrante que vai do Ascendente (Horóscopo) ao  Meio do Céu e aqueles do quadrante oposto, do Descendente ao Fundo do Céu (Fundo da Terra ou Baixo Meio do Céu), e os dos outros dois quadrantes como vespertinos e femininos. 

  Acrescentaram também outras descrições aos signos, resultantes da sua representação. Refiro-me, por exemplo, a "de quatro patas", "terrestres", "dominantes" e ""férteis", bem como de outras ordens similares. Estas, dado que a sua razão e significado derivam directamente de  si, consideramos supérfluas de elencar, visto que a qualidade das configurações pode ser expressa nas previsões, se se revelar relevante e útil.

Tradução do Grego RMdF


Edições Utilizadas:
  • Hübner, Wolfgang, Claudii Ptolemaei opera quae exstant omnia, Vol. 3, 1, Apotelesmatika. Estugarda e Leipzig: B. G. Teubner, 1998, pp. 48-51.
  • Robbins, Frank Eggleston, Ptolemy - Tetrabiblos. Cambridge (Mass.) e Londres: Harvard University Press e William Heinemann Ltd., 1964, pp. 68-71.


Comentário

  A leitura atenta do Tetrabiblos pode muito bem representar o marco entre um astrólogo sério, que prefere o estudo às opiniões vãs, e o astrólogo que se sustenta na fama dos seus mestres e no conhecimento opinativo, desprovido de rigor e sem um sistema de sentido coerente e aprofundado. Desde que foi escrito, entre os anos 145 e 168 da Era Comum, foi a obra astrológica mais citada e que serviu de base para todos os desenvolvimentos futuros. Até meados do Século XVII, o conhecimento  astrológico, expresso por Ptolomeu, ainda era ensinado nas universidades. 

  No início do Tetrabiblos, o sábio grego descreve o seu propósito inaugural, estabelecer um sistema de "astronomías prognôsticón", ou seja, tecer prognósticos ou previsões a partir do conhecimento astronómico. A astrologia é um processo de transferência de sentido entre os efeitos do universo na humanidade e no seu mundo e a sua interpretação, daí que a astrologia seja uma forma de linguagem. Esta definição de astrologia pode ser aplicada ao tempo de Ptolomeu se tivermos em consideração que a astronomia/astrologia era uma ciência que pertencia ao domínio da filosofia natural, logo antes de ser ciência era uma linguagem filosófica. Por outro lado, a astrologia, como forma de analisar o humano enquanto categoria filosófica, é uma síntese da psicologia clássica, daí que se diga que existe uma simbiose entre o Almagesto e o Tetrabiblos. Se um procura o fenómeno, o outro detém-se no valor do fenómeno e no modo como se relaciona com o humano.

  A questão textual é também de suma importância, pois, apesar de não termos um manuscrito do Tetrabiblos da época em que foi escrito, as citações e versões posteriores vêem corroborar o seu valor e a sua importância. Heféstion de Tebas, cerca de duzentos anos após a morte de Ptolomeu, cita-o com frequência e faz da sua obra, juntamente com a de Doroteu de Sidon, as suas principais referências. Aliás a sua obra, Apotelesmatika, e as suas citações do Tetrabiblos servem ainda hoje para validar e verificar traduções e versões posteriores. A primeira das quais, pelo menos a primeira que merece nota, é a de Hunayn ibn Ishaq, datada do século IX. O Califa Abássida al-Ma'mūn colocou Hunayn ibn Ishaq como responsável da Casa da Sabedoria, Bayt al Hiknak, um centro cultural em Bagdad, que é hoje representativo da Era de Ouro Islâmica e onde os textos gregos eram traduzidos para sírio e árabe. Foi, sobretudo, este esforço de preservação da sabedoria clássica que permitiu que hoje tenhamos acesso aos textos, bem como possibilitou o neoclassicismo do Renascimento. 

  A Paráfrase de um Pseudo-Proclo, escrita no século V e da qual existe um manuscrito do século X, é o mais antigo elemento textual completo que dispomos e, embora seja uma apresentação simplificada do texto original, foi predominante onde as versões do árabe tiveram menor presença. Por outro lado, a presença árabe na Península Ibérica permitiu a tradução para latim da obra de Ptolomeu. A primeira tradução que se conhece que foi elaborada por Plato de Tivoli e Gerardo de Cremona, em Barcelona, no ano de 1138. Em 1206, foi feita uma nova tradução a partir de fontes árabes, mas de autor anónimo. Do grego para o latim, é de salientar a tradução de Hermann da Dalmácia e, no século XIII, também tem de se referir a de Aegidius de Thebaldis. A maioria das edições que circulavam, tanto no mundo árabe como na cristandade, incluíam o comentário do século XI de Ali ibn Ridwan. Foi este imperioso esforço de tradução e a vontade de conhecimento que levou a que, no século XVI, o Tetrabiblos fosse levado à estampa, por Camerarius no ano de 1535, em Nuremberga, e no de 1553, em Basileia, e por Junctinus no ano de 1581, em Leiden.

  Em vernáculo, a primeira tradução que se conhece é francesa e foi realizado sob o patrocínio de Carlos V. Desta tradução, existe um manuscrito que data de 1363. Apesar de não se conhecer, na Península Ibérica, uma tradução para castelhano ou português, o trabalho da Escola de Toledo produziu, a mando de Afonso X, uma súmula, Libros del Saber de Astronomia, com os contributos de astrónomos/astrólogos árabes, judeus e cristãos que relavam o conhecimento e influência do Tetrabiblos. É também de frisar que esta obra foi oferecida por Afonso X ao seu neto, o rei D. Dinis de Portugal. O Tetrabiblos cedo se tornou a bíblia da astrologia e a sua importância só foi mitigada no século XIX, em pleno domínio positivista, quando a sua autoria foi posta em causa, pois o racionalismo totalitário não permitia que uma obra de astrologia fosse da autoria de Ptolomeu, um cientista. Foi esse mesmo obscurantismo que fez com que astrologia fosse purgada da vida e obra de homens como, por exemplo, Kepler ou Newton.

  Outro aspecto textual de relevo é o título. A obra comummente conhecida como Tetrabiblos ou, pela versão latina, Quadripartitum, aponta para o número de livros que o compõem, quatro. Porém, na introdução, Robbins indica o que seria o seu título completo, isto porque ele não é indicado pelo autor. Segundo Robbins, o título mais adequado seria: Mathematikê Tetrábiblos Sýntaxis, ou seja, Tratado de Matemática em Quatro Livros. Este título revela a proximidade conceptual entre a astrologia e a matemática, que, na esteira de Platão, é condição para a aprendizagem da filosofia. No entanto, Hübner, a partir da primeira frase do tratado, "tó pròs Sýron apotelesmatiká", propõe o título Apotelesmatika, que aliás é comum a várias obras de astrologia, designando um tratado acerca do efeito das estrelas no destino humano.

  O capítulo aqui traduzido revela uma escolha, um modo de representar a forma como a astrologia interpreta a realidade. O masculino e o feminino indicam, nesta passagem, o processo de tradução da polaridade natural para uma estrutura de sentido. Os opostos podem apresentar-se tanto como elementos metafísicos, como princípios naturais, daí que a análise dos signos masculinos e femininos não se limite à presunção biológica de macho ou fêmea. A astrologia divide os signos tal como a realidade separa as naturezas contrárias, almejando encontrar a sua harmonia. Porém, a vinculação de um signo a um género não é nem simples, nem redutora, uma vez que são as especificidades de um signo que definem a sua natureza masculina ou feminina. Por exemplo, o eixo equinocial (hisêmerinós), expresso pelos signos de Carneiro e Balança, assume uma natureza masculina, todavia a expressão masculina de Carneiro e Balança é distinta. Marte, um planeta masculino, em Carneiro, está no seu domicílio diurno, mas, em Balança, está em exílio, logo a sua expressão masculina é débil, pois é regido por Vénus, um planeta feminino. O mesmo pode ser aplicado ao eixo solsticial (tropikós), uma vez que Marte esta em exaltação em Capricórnio e em queda em Caranguejo, ambos signos femininos. Desta forma, podemos dizer que a natureza dominante, leia-se, segundo o texto, masculina, é mais forte em Capricórnio, embora feminino, que em Balança. Daqui se depreende que as categorias masculino e feminino não se reduzem a uma mera atribuição linear.

(...)
Fim do Excerto